quinta-feira, 7 de maio de 2009

O DEVER DA DENÚNCIA por Carlos Alberto Di Franco


O leitor é sempre o melhor termômetro para medir a temperatura da cidadania. Em meu último artigo tratei do cinismo antiético que domina amplos setores do Congresso Nacional. O episódio das passagens aéreas reuniu situação e oposição no mesmo balaio da amoralidade. A nota oficial do presidente da Câmara, Michel Temer, é de uma esquizofrenia flagrante. Reconhece malfeitorias, mentiras e abusos. O corolário do silogismo, no entanto, não é a punição. Tudo acabou em novas regras e numa formidável anistia. Se todos, ou quase todos, estão envolvidos, ninguém é culpado. Viva a impunidade! Recebi 84 e-mails de leitores de várias cidades brasileiras. Uma boa amostragem de opinião pública. Um denominador comum esteve presente em todas as mensagens: indignação e pessimismo.
Muitos brasileiros, equivocadamente, começam a descrer da democracia. Paira no ar uma perigosa sensação: o Congresso Nacional não serve para nada. Vislumbra-se uma relação de causa e efeito entre corrupção e democracia. Alguns, sem dúvida desmemoriados, têm saudade de um passado ditatorial de triste memória. Reféns do desalento, sinalizam um risco que não deve ser subestimado: a utopia autoritária.
O Brasil, apesar dos pesares, tem instituições razoavelmente sólidas, embora parcela significativa da sociedade, como já disse, comece a questionar a validade de um dos pilares da democracia: o Congresso Nacional. O descrédito generalizado, sobretudo dos parlamentares, captado em inúmeras pesquisas de opinião, é preocupante. Queixa-se também a sociedade da impunidade radical. O fato de a Policia Federal prender e o Judiciário soltar, independentemente de eventuais razões processuais que possam justificar o procedimento, conspira contra a credibilidade da Justiça. Que fazer? Eis a pergunta que está no fundo do gigantesco descontentamento nacional.

Nós, jornalistas, sem qualquer engajamento ideológico, mas cumprindo rigorosamente nosso dever de denúncia, podemos contribuir poderosamente para a renovação ética do País. O combate à corrupção deve ser uma bandeira permanente. Para isso, em primeiro lugar, é preciso fugir do jornalismo declaratório e investir pesadamente na metodologia da dúvida. Interrogar e duvidar é um dever profissional elementar, sobretudo quando se cobrem assuntos de interesse público.
Todos os manuais de redação consagram a necessidade de ouvir os dois lados de um mesmo assunto. A busca da isenção, no entanto, não significa a equivocada opção pela neutralidade. Os leitores não querem um jornalismo insosso e incolor. Querem uma mídia comprometida com a verdade. Tal compromisso, como é lógico, reclama, muitas vezes, uma informação que desemboca na denúncia consistente.
Na falta do bom ceticismo (jornalistas não podem ser ingênuos), o predomínio das aspas ocupa o lugar da informação. Um exemplo é suficiente: o agressivo marketing do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Inúmeras foram as manchetes reproduzindo declarações do presidente da República e da Chefe da Casa Civil a respeito do novo milagre brasileiro. Poucas, muito poucas, mostraram a realidade dos fatos: o PAC é uma bela parola! E a nossa missão é (ou deveria ser) rasgar o declaratório e mostrar a verdade. Declaração não é ponto de chegada. É ponto de partida. É pauta. Precisamos ver e confrontar a realidade com as promessas. Sem isso, o jornalismo deixa de ser socialmente relevante.
Complementa-se o dever da denúncia com o que eu chamaria de jornalismo de buldogues. Precisamos, todos, ser a memória da cidadania. Sugiro, mais uma vez, uma simples, mas eficiente terapia de combate à imoralidade: o placar da corrupção. Mensalmente, por exemplo, a imprensa exporia um quadro didático dos principais escândalos: o que aconteceu com os protagonistas da delinquência, as ações concretas ou as omissões dos Poderes Executivos, Legislativo e Judiciário. Seria bom, em período eleitoral, elencar os nomes dos congressistas que participaram ativamente da farra das passagens aéreas e de outros desmandos. Trata-se de serviço público de primeira grandeza.
É dever ético da imprensa promover uma ampla conscientização popular da relevância que os cargos públicos têm e da importância de que pessoas absolutamente idôneas os ocupem. É preciso mostrar eventuais descompassos entre o discurso e a realidade. Os programas eleitorais vendem uma bela embalagem, mas, de fato, são paupérrimos na discussão das idéias. Nós jornalistas devemos ser o contraponto a essa tendência. Cabe-nos a missão desnudar o que o marketing esconde.
“A imprensa”, dizia Rui Barbosa, “é a vista da Nação. Por ela é que a Nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam.” (...) “O poder não é um antro: é um tablado. A autoridade não é uma capa, mas um farol. A política não é uma maçonaria, e sim uma liça. Queiram, ou não queiram, os que se consagraram à vida pública, até à sua vida particular deram paredes de vidro. Agrade, ou não agrade, as constituições que abraçaram o governo da Nação pela Nação têm por suprema esta norma: para a Nação não há segredos; na sua administração não se toleram escaninhos; no procedimento dos seus servidores não cabe mistério; e toda encoberta, sonegação ou reserva, em matéria de seus interesses, importa, nos homens públicos, traição ou deslealdade aos mais altos deveres do funcionário para com o cargo, do cidadão para com o país.”
Pois bem, caro leitor: um abismo separa os ideais de Ruy Barbosa dos usos e costumes da Ilha da Fantasia. Mudar é preciso.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

JORNAIS, IGREJA E ESTADO por Carlos Alberto Di Franco


O Brasil é um país de expressiva maioria católica. A informação de religião, portanto, merece atenção especial. A quantidade da informação religiosa, em geral, é bastante razoável. Alguns riscos, no entanto, ameaçam a qualidade da cobertura jornalística. Sobressai, entre eles, a falta de especialização, o razoável desconhecimento técnico e, reconheçamos, certa dose de preconceito. Acresce a tudo isso o amadorismo, o despreparo e a falta de transparência da comunicação eclesiástica. Recentes episódios, lamentáveis, evidenciam a urgente necessidade de profissionalização da comunicação institucional da Igreja.
A Igreja Católica, instituição de grande presença e influência na agenda pública brasileira, é sempre notícia. Trabalhar a informação religiosa com rigor e isenção é um desafio. Muitas vezes ganhamos. Outras, perdemos. Em sua primeira viagem à África, o papa Bento XVI reafirmou a oposição da Igreja ao uso dos preservativos. Os jornais afirmaram que Bento XVI teria dito que "a camisinha agrava a aids". Errado. O que o papa disse e tem repetido é que a verdadeira luta contra a aids passa pela "humanização da sexualidade". A mera distribuição de preservativos é, segundo a Igreja, uma estratégia equivocada. A Igreja prega abertamente que a fidelidade dentro do casamento heterossexual, a castidade e a abstinência são a melhor maneira de combater a aids. Tal postura não decorre de uma histeria conservadora. Resulta, na verdade, de conceitos antropológicos profundos, embora, reconheço, politicamente incorretos. Podemos concordar ou discordar, podemos achar que se trata de uma exigência excessiva, mas não podemos desqualificar por baixo.
A mídia dá foco absoluto ao que a Igreja faz ou fará. Gente de todas as denominações cristãs (e até mesmo sem qualquer profissão religiosa) dá opiniões sobre os caminhos que a Igreja Católica deve adotar. Se a Igreja estivesse de fato fora do tempo, anacrônica e ultrapassada, poucos se dariam a esse trabalho. A eleição de Bento XVI, por exemplo, foi um case jornalístico interessante. A cobertura, lá fora e aqui, foi quantitativamente exuberante. Do ponto de vista da qualidade, no entanto, ficou bastante aquém do que poderíamos ter feito. Ficaram, alguns jornais, reféns de declarações de reduzidos e conhecidos desafetos do então cardeal Ratzinger. Criou-se, assim, uma falsa imagem do novo papa. Bento XVI seria um eclesiástico duro, quase intratável. Quem o conhece, e nós o vimos de perto aqui no Brasil, sabe que se trata de um brilhante intelectual, mas também de um homem simples, cordial, com uma ponta de timidez que desarma e cativa.
Agora, como papa, por óbvio, defende o núcleo fundamental da fé católica. Sem essa defesa, muitas vezes na contramão dos modismos de ocasião, a Igreja perderia sua identidade. Se os papas procurassem o "sucesso" - que parece ser a medida suprema da realização para os que tudo medem pelos ibopes -, bastaria que, esquecendo-se da verdade que custodiam, se tivessem bandeado pouco a pouco, como fazem certos "teólogos", para os "novos valores" (em linguagem cristã, contravalores) que cada vez mais tentam dominar o mundo.
É patente que, na hora atual, vivemos uma encruzilhada histórica em que são incontáveis os que parecem andar pela vida sem norte nem rumo, entre as areias movediças do niilismo. O papa teve sempre plena consciência dessa situação e, em vez de sentir a tentação daqueles teólogos que aspiram aos afagos do mundo para dele receberem diploma de "modernos" e "progressistas", ele dá, diariamente, a vida por uma verdade que pode resgatar este mundo, sem se importar com que o chamem de retrógrado, conservador ou desatualizado. Ou será que se espera um papa que deixe de ser cristão para ser mais bem aceito?
Pretende-se que, perante este deslizamento do mundo para baixo, com a glorificação de todo nonsense moral, o papa exerça a sua missão acompanhando a descida, cedendo a tudo e se limitando a um vago programa socioecológico, a belos discursos de paz e amor e a um ecumenismo em que todos os equívocos se podem abraçar e congraçar, porque ninguém acredita mais em coisa alguma, a não ser em viver bem? Mas a coerência doutrinal da Igreja, por vezes conflitante com certas posturas comportamentais, tem sido um fator de defesa e elevação ética das sociedades.
O crescimento da Igreja, como salientou Bento XVI, dá-se "muito mais por atração", nunca por imposição. Entre uma pessoa de fé e um fanático existe uma fronteira nítida: o apreço pela liberdade. O sectário assume a sua convicção com intolerância. O fanático impõe. A pessoa de fé, ao contrário, assenta serenamente em seus valores. Por isso, a sua convicção não a move a impor, mas a estimula a propor, a expor à livre aceitação dos outros as ideias que acredita dignas de serem compartilhadas.
A correta informação sobre a Igreja passa pelo reconhecimento de seu papel na sociedade e pelo seu direito de transitar no espaço público. Caso contrário, cairíamos no laicismo antidemocrático. O Estado é laico, mas não é ateu. O laicismo militante pretende ser a "única verdade"racional, a única digna de ser levada em consideração na cultura, na política, na legislação, no ensino, etc. Por outras palavras, o laicismo é um dogmatismo secular, algo tão pernicioso quanto o clericalismo do passado.
Tentar expulsar a Igreja do debate em defesa da vida, por exemplo, é arbítrio laicista. A independência é um bem para a Igreja e para o Estado. Mas não significa ruptura e, muito menos, virar as costas para o Brasil real, uma nação de raízes culturais cristãs. Informar com isenção é um desafio. E é aí que mora o fascínio da nossa profissão.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

O Divino Infante que nos visitou


“Eis que vos anuncio uma grande alegria que será partilhada por todo o povo, pois nasceu-vos hoje o Salvador”. Neste dia em que celebramos o natal do Senhor, fazemos memória do tempo em que fomos visitados por Deus. Uma visita distinta e, sem duvidas, especial. Jesus, o Deus-Filho, a segunda pessoa da Santíssima Trindade veio até nós assumindo toda a nossa humanidade. No antigo testamento, o profeta Isaías faz o prenúncio do Salvador com as seguintes palavras: “Nascerá uma haste do tronco de Jessé e, a partir da raiz, surgirá o rebento de uma flor; sobre ele repousará o espírito do Senhor: espírito de sabedoria e discernimento, espírito de conselho e fortaleza, espírito de ciência e temor de Deus; no temor do Senhor encontra ele seu prazer”(Is 11,1-3a).
São Leão Magno, papa muito destacado por conta de seus belíssimos sermões nos lembra de nossa distinção de cristãos. Devemos tomar consciência de nossa dignidade, pois hoje nasceu a vida. Vida que dissipa o temor da morte, que nos enche de alegria com a viva esperança da eternidade. É Jesus que vem até nós para libertar a todos. Exulte o justo, porque se aproxima da vitória; rejubile o pecador, porque lhe é oferecido o perdão; reanime-se o pagão, porque é chamado à vida.
Tudo o que é narrado pela sagrada escritura sobre o nascimento de Jesus Cristo vem como confirmação de sua missão. Ele se fez pobre com os pobres. Viveu a nossa vida e em tudo foi experimentado, exceto no pecado. Porém, fixemos nosso olhar para aquele dia em que o amor de Deus se derramou sobre nós. Numa noite fria, depois da longa jornada para o recenseamento, José estava aflito, pois sua esposa, Maria, sente as contrações do parto. Na cidade de Belém, as portas se fecham, pois não há lugar para eles. A ultima opção se torna realidade. No estábulo, junto aos animais, nasce o Salvador. Santo Afonso Maria de Ligório diz não saber explicar como as palhas da manjedoura e todo o presépio não se incendiaram com o tamanho amor inflamado por Deus naquele instante divino e sublime.
Deus realiza o que por nossas puras forças era impossível. Jesus se reveste de nossa carne e nasce Divino Infante: Deus se faz homem! Alegre verdade de nossa existência! É um mistério de fé que cremos e professamos. É este grande mistério que os coros cantam na noite de Natal: Ó grande mistério, e admirável sacramento, os animais verem o Senhor nascido, deitado no presépio. Bem-Aventurada a Virgem cujas entranhas mereceram trazer o Senhor Jesus Cristo. Aleluia. O advento, esse tempo de quatro semanas que antecederam o santo natal de Jesus Cristo, criou em nós esse sentimento de expectativa. Esperamos com felicidade aquele que a de vir. O canto de Glória e o Aleluia vêm com grande força a nossa garganta que proclama com vigor o nascimento do Filho de Deus. Exclamamos com a feliz surpresa dos pastores, com a reverência dos magos e a adoração da corte celeste. Ele já havia sido anunciado como Emanuel, “Deus conosco” (Is 7,14), “Conselheiro admirável, Deus forte, Pai eterno, Príncipe da paz” (Is 9,5).
É nosso dever receber hoje esse menino que nasce no natal. Tarefa esta destinada a toda a humanidade fiel à Cristo e a sua proposta do Reino de paz e amor. A nós é incumbida a tarefa de zelar para que o Divino Infante, o Menino Jesus, nasça na dignidade da pureza de nosso coração. E ao vê-lo reclinado na manjedoura de nosso coração, entre as palhas de nossa limitação humana ajoelhemo-nos para adorar a encarnação de Jesus, o Cristo. Dexemo-nos penetrar por essa atmosfera de graças e bênçãos oriundas do Divino Infante. Não nos esqueçamos, porém, do exemplo da Virgem Maria. Segundo São Bernardo “convinha a um Deus nascer de uma Virgem, e uma Virgem só podia conceber um Deus”.
Por amor Ele quer nascer em nosso coração. Por amor tão somente. É assim o nosso Deus. Tudo tão simples e tão completo. Juntemos hoje, a nossa voz a voz dos anjos todos para cantarmos jubilosos: Glória a Deus nas alturas; e anunciam: Paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14). A Você e a sua família eu desejo um Feliz e Santo Natal! Veníte adorémus Dóminum – Oh! vinde adoremos o Salvador.

Welinton Silva é seminarista redentorista, licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Goiás, Goiânia.
welintonredentorista@hotmail.com

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A encarnação do Filho de Deus


Já se aproxima a celebração do natal. Isso ao menos se evidencia no movimento econômico de nossas cidades, apesar de toda a crise financeira pela qual o mundo está passando. Nessas últimas semanas, os shoppings e o comércio em geral estão bastante movimentados por ocasião das festas de fim de ano. Afinal isso acontece todos os anos. E todo o ano acontece a mesma coisa. Mas será se nós temos conhecimento daquilo que celebramos todos os anos com tanta avidez?!
Santo Afonso Maria de Ligório, no seu livro Encarnação, Nascimento e infância de Jesus nos diz que “muitos cristãos costumam preparar com bastante antecedência em suas casas um presépio para representar o nascimento de Jesus Cristo. Mas há poucos que pensam em preparar seus corações, a fim que o Menino Jesus possa neles nascer e repousar.”. E é sobre o mistério da encarnação de Jesus Cristo que hoje quero refletir com o amigo leitor.
Sem dúvida alguma, o mistério da encarnação de Jesus é algo muito importante para todos os cristãos e revela a maior prova de amor de Deus a humanidade. Por amor a nós homens, o nosso Criador quis se fazer homem como nós, abstendo-se somente do pecado. Assim São Paulo escreveu aos filipenses: “Sendo ele de condição divina, não se prevaleceu de sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e assemelhando-se aos homens. E sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz” (Fl 2,6-8).
Não podemos apreender toda a imensidão do mistério da encarnação de Jesus Cristo, porque somos incapazes de compreender a profundidade do Seu amor por nós. Para nos dar testemunho desse amor pleno, Jesus, o filho de Deus-Pai, foi até o extremo. Fez-se homem, colocando toda a sua divindade na nossa humanidade, aceitando viver dentro dos limites da criatura. Assumiu a nossa fraqueza, aceitou os nossos limites, chorou as nossas lagrimas, sofreu as nossas dores e foi assassinado com uma das piores condenações de seu tempo. Ele tudo fez para apresentar-nos o seu louco amor por nós. Mesmo sendo Deus “passou pelas mesmas provações que nós, com exceção do pecado” (Hb 4,15b).
Após Jesus ter-se feito homem como nós, não podemos mais duvidar do imenso amor de Deus pela humanidade. Depois de tudo nos conceder com a criação e a vida, Ele nos fez a sua imagem e semelhança no amor. Ele nos deu a si mesmo, como prova extrema de seu amor sem ressalvas ou exigências.
O nome Jesus, quer dizer Deus-Conosco, Emanuel. É o Filho de Deus que desceu do céu e se encarnou no seio puro e virginal de Maria para libertar-nos da morte eterna do pecado. Encarnando-se, Jesus fez a nós uma ação incomparável: “porquanto os filhos participam da mesma natureza, da mesma carne e do sangue, também ele participou, a fim de destruir pela morte aquele que tinha o império da morte, isto é, o demônio” (Hb 2,14).
Pela encarnação de Jesus, somos filhos adotivos de Deus, irmãos de Cristo e herdeiros do céu. “Mas quando veio a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, que nasceu de uma mulher e nasceu submetido a uma Lei, a fim de remir os que estavam sob a Lei, para que recebêssemos a sua adoção” (Gl 4,4). Essa é a razão da ação de graças com que o cristão celebra o natal. Toda nossa forma de gratidão é levada àquela gruta de Belém, como a oferta daqueles magos que “ofereceram-lhe como presentes: ouro, incenso e mirra” (Mt 2,11c).
Voltemos ao ponto de onde iniciei nossa reflexão. Nas palavras de Santo Afonso de Ligório: “sejamos nós desse pequeno número (dos que preparam o seu coração para o nascimento de Jesus): procuremos dispor-nos dignamente para arder desse fogo divino, que torna as almas contentes neste mundo e felizes no céu”. Que Maria receba Jesus em nosso coração hoje, como O recebeu da primeira vez.

Welinton Silva é seminarista redentorista, licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Goiás, Goiânia.
welintonredentorista@hotmail.com

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Maria, a Imaculada Conceição


Quando falamos da Imaculada Conceição de Maria, fazemos referência a um privilégio que ela recebeu de Deus: ser preservada do pecado original desde a sua concepção. A razão dessa graça dada por Deus a Maria de Nazaré, está na sua vocação por excelência: ser a Mãe de Jesus Cristo, o Filho de Deus. E é pelos méritos de Cristo, que Maria foi preservada imune de toda mancha de pecado original (Bv. Duns Scoto).
Na passagem de Lucas, capítulo 1, versículo 28, o evangelista confirma a predileção de Deus por Maria: “Entrando, o anjo disse-lhe:’Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo’”. Não há na Bíblia uma afirmação explicita que Maria tenha sido concebida sem o pecado original. Trata-se de uma doutrina que sempre esteve implícita na Fé da Igreja.
Já nos primeiros séculos das comunidades cristãs, temos escritos dos padres da igreja sobre a Imaculada Conceição de Maria. Santo Efrém chegou a afirmar que só Cristo e Maria são limpos e puros de toda e qualquer mancha. No início, quando se formavam as verdades de fé, não foi fácil explicar e tornar aceita essa verdade de fé. Contudo, a reflexão contundente dos padres da igreja e pensadores da época, possibilitou que pudéssemos chegar a essa conclusão.
O pensador franciscano Duns Scoto (+1308) buscou dar uma resposta norteadora para a teologia sobre a Imaculada Conceição de Maria: Maria foi preservada do pecado original em previsão dos méritos de Cristo. Ou seja, se não fosse por essa graça de Deus, ela também teria nascido com a mancha do pecado original. É interessante a conclusão de sua tese: Convinha que Deus fizesse a exceção; podia fazê-la; portanto, a fez!. Isto é, Deus queria, podia, então fez.
A devoção na Imaculada Conceição se fortaleceu a partir do século XV, com o Concílio de Trento. Já em 1476, se celebrava uma festa no calendário litúrgico em sua honra. No ano de 1854, o papa Pio IX (1846-1878) promulgou a definição dogmática da Imaculada Conceição da Bem-aventurada Virgem Maria (Bula Ineffabilis Deus de 08.12.1854): “Maria foi preservada imune de toda mancha do pecado original”.
Na definição dogmática, Pio IX diz: “Em honra da santa e indivisa Trindade, para decoro e ornamento da Virgem Mãe de Deus, para exaltação da fé católica, e para incremento da religião cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, e com a Nossa, declaramos, pronunciamos e definimos: A doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado original, essa doutrina foi revelada por Deus, e por isso deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis.”.
Maria também não experimentou a concupiscência, isto é, a inclinação ao pecado, que nasce do pecado e ao pecado conduz. Ela é uma nova criatura. Isenta do pecado, têm condições de notar as escravidões às quais estão expostas todas as pessoas que escolhem esse caminho que não conduz a Deus.
O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira ressalta que “a graça santificante — concedida à Santíssima Virgem Imaculada numa abundância inaudita e insondável — foi correspondida perfeitamente por Ela a cada momento. Assim, se compreende o que seria a ordem interna, a pureza, a virtude e a santidade de Nossa Senhora”.
Maria é totalmente de Deus. É um modelo a quem devemos imitar. É fonte de santidade para toda a Igreja. Também nós, quando crescemos em graus de santidade, santificamos a Igreja. Maria nos deu Cristo, o salvador, e nós precisamos de Cristo para que se efetive nossa salvação. Tanto em Maria, quanto em nós a mesma graça de Deus atua. Só depende de nossa colaboração na instauração do Reino de Deus. Vivamos, a exemplo de Maria, nossa condição de criaturas humanas em sintonia com a vontade de Deus.

Welinton Silva é seminarista redentorista, licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Goiás, Goiânia.
welintonredentorista@hotmail.com

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

A prática da caridade cristã


Hoje, quero refletir com o leitor sobre a prática da caridade. A Caridade é uma das três virtudes teologais, que a Igreja Católica ensina como exercício agradável a Deus. Correspondem às três virtudes: a fé, a esperança e caridade. Paulo, apóstolo, em carta a comunidade de Corinto, coroa seu discurso no capitulo 13, versiculo 13, com a máxima cristã: "Portanto, agora existem estas três coisas: a fé, a esperança e a caridade. Porém a maior delas é a caridade". Caridade aqui se equivale ao amor. O verdadeiro e genuíno amor cristão.
Essa virtude divina foi implantada em nosso ser desde toda criação, pelo amor primeiro de Deus Pai criador. Foi também confirmada em nossa alma através do sacramento do santo Batismo, juntamente com a fé e a esperança. É a virtude pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. Sabemos que as demais virtudes nos conduzem a Deus. A caridade, porém, nos une ao próprio Deus, e onde houver caridade, aí estarão também as demais virtudes. O saudoso papa João Paulo II, afirmou em uma de suas alocuções de audiência geral que, “a fé, a esperança e a caridade são como três estrelas, que se acendem no céu da nossa vida espiritual para nos guiarem rumo a Deus”.
Santo Agostinho já dizia, “Ama a Deus e faze o que quiseres”. É evidente que, se amarmos de verdade a Deus, nos será grato fazer somente o que for do seu agrado. E é ai que quero fazer algumas observações sobre a tragédia em Santa Catarina. Uma tragédia que com certeza deixou a todos os brasileiros um sentimento de compaixão e solidariedade. Os números nos assustam. Já são mais de 118 mortos pelo dilúvio, que desabrigou quase 80.000 e impactou 1,5 milhão de pessoas em Santa Catarina, região sul do Brasil.
A mobilização da sociedade em geral é notória. De todas as regiões partem caminhões com toneladas de alimentos em direção ao vale do Itajaí, e cidades adjacentes, num exercício da verdadeira caridade cristã: a solidariedade. O ser solidário é explicitado em muitas situações não apresentadas pela mídia em geral e infelizmente, explorado demasiadamente em situações como essas. A dor de tamanha situação só poderá ser descrita por aqueles, que a viveram em sua intensidade, como os catarinenses atingidos pela tempestade e suas conseqüências.
Diversas dioceses e arquidioceses pelo Brasil estão empenhadas em ajudar, em nome da Igreja, ao povo mais necessitado de ajuda no estado de Santa Catarina. Notáveis são as iniciativas em andamento, promovidas pela Arquidiocese de Florianópolis, pelas Dioceses de Joinville, de Blumenau e pelas Entidades-membro de Cáritas no Estado. Doações de alimentos e roupas estão sendo feitas diretamente nas secretarias das Paróquias destas Igrejas particulares, que também estão acolhendo os desabrigados em seus salões comunitários, centros catequéticos e casas religiosas, numa atitude de amenização e solidariedade para com o próximo, que perdeu tudo ou quase tudo. A Igreja se inspira na caridade ensinada por Jesus: Tudo o que vocês fizerem ao menor dos meus irmãos é a mim que vocês fazem.
A presença solidária da Igreja e a caridade do Santo Padre o Papa, é uma das primeiras a chegar a esses locais, onde a comunidade está desassistida do verdadeiro e necessário auxílio do poder público. É na comunidade-igreja que a solidariedade se revela por primeiro. É lá, onde todos vivem como irmãos, filhos do mesmo Pai. Aí a caridade realiza milagres. A Sagrada Escritura nos apresenta o sugestivo dito de Jesus em Mateus 14,13-21: “Dai-lhes vós mesmos de comer”. O milagre da partilha cristã está ao alcance de todos que crêem no Cristo.
Usando as palavras do Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, "a caridade é a virtude teologal, pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos por amor de Deus. Jesus faz dela o mandamento novo, a plenitude da lei”. (CIC, n. 388). Que possamos ser todos nós sinais de esperança e vínculo de caridade a todos os homens, que receberam a fé de Jesus e nele crêem. É no Cristo que está a nossa força, Ele é a razão de nossa esperança!

Welinton Silva é seminarista redentorista, licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Goiás, Goiânia.
welintonredentorista@hotmail.com

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Impressões sobre Mossâmedes


Na última terça-feira (25/11) tive a oportunidade de estar na cidade de Mossâmedes, aqui no interior de Goiás. Tratava-se de uma animação missionária que se iniciava com a chegada da imagem peregrina do Divino Pai Eterno. Um clima de alegria e festa pairava no ar da pacata cidade. Mossâmedes estava recebendo mais um filho seu para com aquele povo se alegrar.
O Diác. André Ricardo, missionário redentorista volta a sua cidade natal para ser ordenado sacerdote. Isso, pela oração da Igreja e imposição das mãos de Dom Eugênio Lambert Rixen, Bispo da Diocese de Goiás – GO. A cidade de Mossâmedes tem pouco mais de cinco mil habitantes. Sua origem remonta os tempos do extrativismo do ouro em cidades ouríferas do interior de Goiás.
Tenho comigo um costume que trago desde criança. Quando chego a uma cidade que ainda não conheço, procuro logo saber da localização da Igreja Matriz. Lá posso tirar algumas tímidas e simples conclusões. No caso de Mossâmedes, tive a surpresa de ver que a fé de seu povo segue uma linhagem de gerações a fio. As grossas paredes da Matriz de São José evocam uma áurea de fé e devoção. No frontispício do edifício religioso traz a possível datação de sua construção: 1774. Em seu interior, no presbitério, ainda se conserva o retábulo com o antigo altar que lembra o tempo em que as missas eram rezadas em latim.
Do cimo daquele retábulo, no orango da Igreja, se vê a imagem de São José de Botas que, do alto, vela pela comunidade mossamedina que lhe confiou o patrocínio de sua cidade.
Mais algumas coisas me chamaram a atenção e eu gostaria de partilhá-las com o leitor. Nota-se que o povo é engajado, se preparando em oração (naquilo que a filologia da palavra exige: orar e ação) para receber a visita do Pai Eterno e realizar com orgulho a ordenação sacerdotal do Diác. André Ricardo. Na Santa Missa presidida pelo redentorista, Pe. Jesus Flores, para a recepção dos missionários redentoristas e da Imagem levada de Trindade, estava presente além da comunidade mossamedina, o Pe. Marques (pároco de Mossâmedes) e o Pe. Francisco Cavazzuti. A esse último religioso quero dedicar as próximas linhas deste artigo.
Pe. Francisco Cavazzuti é um místico mártir dos tempos atuais. Afirmo isso após te-lo conhecido pessoalmente e ter lido o seu livro de poemas intitulado “Salmos da Obscuridão”. Há pouco tempo Ele voltou para a sua terra natal, a Itália, e sua presença entre nós durante esses dias se deve à ordenação sacerdotal do Diác. André Ricardo.
Pe. Chico é mais uma vitima da pistolagem que buscava silenciar a voz daqueles que defendem a luta justa do povo pela terra. No dia 27 de agosto de 1987 sofreu um atentado contra a vida que o deixou cego em um povoado daquela mesma paróquia de Mossâmedes. Ele perdeu a visão biológica para ver com os “olhos da alma”, com os olhos dos outros. Mas, ao final da celebração eucarística, a qual estive presente, notei uma movimentação ali perto de mim. Grupos de pessoas se revezavam diante do Pe. Francisco. Todos querem a sua benção e saudação fraterna. Ele transmite uma luz efusiva com sua presença que é impossível não notar.
É digno de oração um de seus poemas mais famosos. Reza assim: “Senhor, eu sou cego. Dai-me o Espírito da Luz. Dai-me a luz do Espírito. Senhor, quanto o Mundo está cheio de tristeza! Dai-nos a alegria da ressurreição. Dai-nos a alegria da vida nova. Senhor, o teu amor é Esperança. O teu amor é o Caminho, para buscar e encontrar o Amor, também no sofrimento. Senhor, ainda é tão longo assim o caminho para a gente andar? E depois, terá uma Luz, Senhor? Terá Luz, sim!”.
Minha gratidão ao povo de Mossâmedes pela acolhida. Minha reverência ao neo-sacerdote Pe. André Ricardo que me possibilitou viver esses momentos. E, por fim, minha amizade e gratidão ao Pe. Francisco Cavazzuti, pelos preciosos momentos que estive ao seu lado e pude notar seu testemunho e doação, inspirados no próprio Jesus Cristo.

Welinton Silva é seminarista redentorista, licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Goiás, Goiânia.
welintonredentorista@hotmail.com